sábado, 30 de maio de 2009

Nosso Futuro

Tela de Dino Valls



Andei formulando um sentido,

Criei uma imagem num mapa

Que representasse seu enquadramento

Em minha vida.


Desordenaram-se as linhas

Apagando o caminho desenhado.


Um véu de emanações tardias

Enrolou-se nas coisas ditas.

Mostrando-me, enfim, a tênue linha

Que nos prendia.


Nossa vida singular era delírio,

Não passava de invenção,

De um plano imponderável.


Contido nas linhas escritas,

Foi incapaz de suportar a travessia,

De alcançar um outro lugar para a verdade.


Nosso futuro ficou sem infinito,

Ficou solto, em algum lugar

De meu plano escrito.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Descompasso

Tela de Marc Chagall


Sua mão que vem, minha mão que vai.

Descompasso da primeira vez.

Lembro os erros quando me entreguei.

Inventei você no vapor de minha pele.

Acreditei no breve olhar que guardei.

Roubei o mundo que você movia.
Sacudi os sonhos, até despertar.


Juntei os travesseiros na memória da mão,

Para colher o que restava da recordação.


Aquele caminhar a dois inventei,

Sua mão não foi, minha mão calei.

Miríade

Ilustração de André Toma


Não mais os confusos pesadelos,

Não mais os fantasmas

Rondando a fraqueza.

Alguns até tentaram

Arrancar-me confissões.

Inventaram mentiras, infâmias,

Para me amortalhar no medo.


Lutei no campo das angustias,

Levantei armas e vivi

A aventura do guerreiro.

Deitei o sangue no combate,
Para acreditar de novo,

Nos que fizeram trincheiras.

Perplexos, eles debandaram vencidos.


Voltei para o meu lugar

E vi lágrimas virarem

Miríade de pontos cintilantes,

A saírem dos olhos cheios

De orgulho de meu amor.

sábado, 16 de maio de 2009

A Mais Bela

Tela de Marc Chagall



Sombras quietas espiam entre os muros.

Esperam entre os choupos do jardim.

Não reconheço ninguém nelas.

São da cidade de pedras

Vigiam o tempo e esperam

A canção da partida.


Prestam homenagem a mais bela,

A que servia o vinho doce

Das vindimas do prado.

A que dançava à chuva,

Que deleitava o senhor da casa.


Em esplendor chega a amante

Dizendo querer à noite.

Falando do louvável passeio

Que fará no último de seus dias.


Sombras quietas surgem sagradas.

Seguem a lua carregando

A mais bela.


Vestem-na de ar e suspiros.

Derramam óleo ungido em sua alva fronte.


Seguem todas dignas,

Sem profanar o chão de estrelas.

Sobem ocultas pelas nuvens.

Rodopiam ao soprar do vento.

Cerram as pálpebras,

Todas juntas, para sempre.