A dor líquida e sonora,
Vinda num mar de espasmos,
Terremoto abrindo estrada,
Que ia levando uma procissão
De nervos e ossos.
Destruindo tudo no vale da cintura,
Desenrolando-se um cataclismo
No corpo branco e liso.
Ela machucava com precisão de mestre,
Dava testemunho de sua arte
Na fundição dos gritos.
Houve pressas, esquecimentos,
Idas e vindas.
Doutores sussurrando vozes,
Manejos de agulhas,
Tesouras e pinças.
Respiração em tubos,
Líquidos cristalinos,
Entorpecentes e calmadores.
Touca branca, linho engomado,
Noviças e mestres,
Com seus crisóis preciosos
Esculpindo minha carne fresca.
E uma luz resplandecia
A alma e além dela.
Vou numa barca celestial
Em cúpula cabalística,
E paro na fronteira arquitetônica,
Da sala esterilizada.
Santa Marina
Rogai por minha pedra cristalina,
Enquanto esses seres alados,
Passeiam sob a luz
De altíssimas janelas.
Tão pouco pano
Cobre-me à carne trêmula,
Antes de fundirem-me
No esquecimento,
Ouso a voz de Santa Marina,
Aceitando minha voz chorosa.
Dou-lhe ouro pelo acalanto,
E prata pelas lágrimas recolhidas.
Volto ao capricho,
De um corpo de melindres,
De idas e vindas
Que se acalmam.
Depois de brevíssimo silêncio,
E incenso queimado à minha Santa,
Desprendo-me dela
E sigo em frente,
Sou de novo metal,
Trabalhada agora
Por antiga ourivesaria,
Tendo só valor sentimental
Como jóia de família.
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